quinta-feira, 27 de agosto de 2009

A Minha Versão.

As vozes repentinamente emudeceram-se. Todo e qualquer som cessou por um instante, esperando o som que ainda estava por vir. Por um momento vi-me rezando, não era uma coisa que fazia com frequência, mas fiz. Enquanto o mundo descansava de suas voltas ininterruptas, eu pensava comigo mesmo: Tomara que não aconteça nada (com ela, sempre com ela), ou eu não sei o que será de mim daqui pra frente. O mundo girou, e soou com ele o tão esperado naipe de metais. Naquele segundo meus olhos se fecharam, como se não quisessem abrir, não queriam, mas abriram.

Percebi claramente que não me tinha acontecido nada, o impacto fora sensível ao meu cotovelo esquerdo, mas não doía. Para ser sincero, naquele momento me furtava da consciência de ter um braço. Olhava nos olhos dela (ou pelo menos o que o sangue me deixava ver), e tentava (sem êxito) me manter calmo. Pisquei. Estávamos em pé, de frente um para o outro, não me controlei, e o nome dela foi cuspido de minha boca num ato de desespero, agora era ela que tentava me acalmar. Pisquei. Tinha algo em minha mão, tinha números, era um telefone, mas as sequências fugiam de minha cabeça. Precisava vê-la, mas sabia que o melhor era chamar ajuda. Medi minhas palavras com a precisão que podia (não muita) e ao terminar corri pra vê-la. Me entranhei pelo meio de pessoas que não conhecia, não confiava. Quando a vi o sangue escorria como as lágrimas tentavam escorrer por meu rosto, mas não queria evidenciar minha fraqueza, não naquele momento. Enquanto segurava sua mão ela me dizia que estava tudo bem, mas dificilmente eu prestava atenção no que dizia, me concentrava em ouvir sua voz, que já me acalmava (pouco) por si só.

Tinha as minhas mãos nela o tempo todo, até o momento de ter certeza que estava em mãos seguras. Gente de branco que não são transeuntes com toalhas sujas. Tentava liberar o máximo de meu desespero até o momento de vê-la de novo. A partir daí prestei-me a elocubrar sobre o corrido e como seria dali para frente. E, infelizmente, não consegui parar.

É impossível descrever o meu sentimento de impotência frente ao caso. O sentimento de saber que essa pessoa que tanto amo está aí, no mundo, indefesa... Sem que nada eu possa fazer. Uma parte minha (egoísta, devo dizer) gostaria que levasse comigo todos os ferimentos, mas uma outra parte fica feliz. Feliz porque nunca no mundo desejaria que minha amada passasse pelo que passei. E ainda passo, a cada vez que essas cenas se decorrem em minha mente.


Filipe Affonso Veloso Alves dos Santos, 27/08/09, seis dias após o acidente.

P.S.: Agradeço a todos que estiveram conosco por esse momento, não há como retribuí-los.


Até "semprequeder".

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